o verão envelhece, mãe impiedosa (Sylvia Plath)

sábado, 23 de janeiro de 2016

Trabalhar cansa



Travessar uma rua fugindo de casa
só um menino o faria, mas este homem que passa
todo dia nas ruas não é mais menino
e não foge de casa.
Em pleno verão,
até as praças se tornam vazias de tarde, deitadas
sob o sol que começa a cair, e este homem que chega
por um parque de plantas inúteis detém-se.
Vale a pena ser só para estar cada vez mais sozinho?
Simplesmente vagar, pois as praças e ruas
estão ermas. Forçoso é abordar uma mulher
e falar-lhe e fazê-la viver com você.
Do contrário, se fala sozinho. É por isso que às vezes
algum bêbado à noite dispara discursos
e repassa os projetos de toda sua vida.
Certamente não é esperando na praça deserta
que se encontram pessoas, mas quem anda nas ruas
se detém vez ou outra. Estivessem a dois
mesmo andando na rua, sua casa estaria
onde está a mulher. Valeria a pena.
Mas de noite essa praça retorna ao vazio
e este homem que passa não vê as fachadas
entre luzes inúteis nem ergue seus olhos:
Sente só o ladrilho que outros homens fizeram
com mãos secas e duras, assim como as suas.
Não é justo deixar-se na praça deserta.
Com certeza há de andar pela rua a mulher
que, chamada, viria ajudar com a casa.






CESARE PAVESE, Trabalhar Cansa, Cosac Naify & 7Letras, coleção Ás de Colete, 2009. Tradução:Maurício Santana Dias 
Imagem: Saul Leiter

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