o verão envelhece, mãe impiedosa (Sylvia Plath)

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Partilha do sensível – o acervo Max Martins


O instinto e a instituição são as duas formas organizadas de uma satisfação possível. 
Gilles Deleuze, “Instintos e Instituições” in A ilha deserta, 2002.


Ao decidir vender o acervo do poeta Max Martins à Universidade Federal do Pará, a família optou predominantemente por um critério emocional – que todo material ficasse em Belém, favorecendo que o espólio estivesse acessível a leitores, estudiosos e pesquisadores da cidade onde o poeta viveu e desenvolveu toda a sua obra. Passados mais de dois anos de sua aquisição, e integrado ao Museu da UFPA, o acervo sequer chegou à fase de catalogação. A redutora falta de verba das instituições públicas de cultura, que corrói transações como essa e, consequentemente os próprios acervos, é a causa alegada. O desgaste de boa parte dos livros da biblioteca particular do poeta já se encontrava em estado avançado bem antes de sua morte. Vê-los amontoados numa sala, fora de estantes e sem a higienização necessária, causa espanto e indignação. Não se conhece os termos ou as condições de compra e venda entre as partes, mas ao fazer a aquisição a Universidade Federal do Pará deveria prever os custos altos que, de fato, envolvem a preservação, conservação, restauração e proteção de acervos bibliográficos. E supor que uma sala, por mais generosa e especial que seja, possa abrigar e vir a ser o espaço adequado para fazer funcionar a usina de criação e pensamento que a obra de Max Martins põe em movimento, na sua diversidade e multiplicidade, aponta e confirma um histórico de enganos e equívocos, um horizonte negativo na guarda de acervos por instituições públicas no Pará. E não cabe aqui apontar exceções, uma vez que se sabe que os espaços de excelência confirmam a desproporcional distribuição dos lugares e a efetiva proscrição. A essa altura, o Museu da UFPA fica devendo à comunidade o levantamento e a publicação de um catálogo que dê conta das informações básicas desse acervo, divulgando-o e incorporando-o à vida cultural de Belém, como informação preciosa à imaginação, pelo que ela é capaz de trazer ao ar livre da cidade, despoluindo saberes e pensabilidades, seus modos e formas de funcionamento, que só a linguagem criativa é capaz de desmobilizar, ativando e articulando qualidade de vida e desenvolvimento humano.

Max Martins em seu gabinete, de onde se vê parte de seu acervo, 1988.

Ney Ferraz Paiva

2 comentários:

  1. Caríssimo Ney, parabéns pela iniciativa de fazer saber tudo isso, e possibilitar a divulgação e também a vontade de fazer alguma coisa para que o acervo do Max Martins seja tratado como merece.

    Acredito que se houver, por parte da população e por parte de nomes conhecidos na arte e literatura, manifestações de qualquer ordem que se façam chegar aos responsáveis pelas "verbas", algo há de ser feito!

    Mobilizemo-nos! A internet é uma boa via para isso.

    Grande abraço.

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  2. pois é, Ney, mais uma cena. Na certa que outras virão. Na certa que outras já se dão e sequer sabemos. Por vezes, sequer sei se se trata de descaso do poder público, ou se da miséria encarnada que é o homem enquanto valores. abraço, andré queiroz

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