O interesse do diário é sua insignificância. Essa é sua inclinação,
sua lei. Escrever cada dia, sob a garantia desse dia e para lembrá-lo
a si mesmo, é uma maneira cômoda de escapar ao silêncio, como ao
que há de extremo na fala. Cada dia nos diz alguma coisa. Cada dia
anotado é um dia preservado. Dupla e vantajosa operação. Assim,
vivemos duas vezes. Assim, protegemo-nos do esquecimento e do
desespero de não ter nada a dizer. "Prendamos com alfinetes nossos
tesouros", diz horrorosamente Barrès; e Charles du Bos, com a
simplicidade que lhe é própria: "O diário, na origem, representou
para mim o supremo recurso para escapar ao desespero total diante
do ato de escrever"; e também: "O curioso, no meu caso, é quão
pouco tenho o sentimento de viver quando meu diário não recolhe
seu depósito". Mas que um escritor tão puro quanto Virginia Woolf,
que uma artista tão empenhada em criar uma obra que retivesse
somente a transparência, a auréola luminosa e os leves contornos
das coisas, tenha se sentido de certa maneira obrigada a voltar para
junto de si, num diário tagarela em que o Eu se derrama e se
consola, isso é significativo e perturbador. O diário aparece aqui
como uma proteção contra a loucura, contra o perigo da escrita. Lá,
em As Ondas, ruge o risco de uma obra em que é preciso
desaparecer. Lá, no espaço da obra, tudo se perde e talvez a própria
obra se perca. O diário é a âncora que raspa o fundo do cotidiano e
se agarra às asperezas da vaidade. Da mesma forma, Van Gogh tem
suas cartas e um irmão para quem escrevê-las.
Parece haver, no diário, a feliz compensação, uma pela outra, de
uma dupla nulidade. Aquele que nada faz de sua vida escreve que
não faz nada, e eis, apesar de tudo, algo de feito. Aquele que se
deixa desviar da escrita pelas futilidades do dia, agarra-se a esses
nadas para contá-los, denunciá-los ou gozá-los, e eis um dia
preenchido. É "a meditação do zero sobre ele mesmo", de que fala,
valentemente, Amiel.
A ilusão de escrever, e por vezes de viver, que ele dá, o pequeno
recurso contra a solidão que ele garante [...], a ambição de eternizar
os belos momentos e mesmo de fazer da vida toda um bloco sólido
que se pode abraçar com firmeza, enfim a esperança de, unindo a
insignificância da vida com a inexistência da obra, elevar a vida
nula à bela surpresa da arte, e a arte informe à verdade única da
vida, o entrelaçamento de todos esses motivos faz do diário uma
empresa de salvação: escreve-se para salvar a escrita, para salvar
sua vida pela escrita, para salvar seu pequeno eu (as desforras que
se tiram contra os outros, as maldades que se destilam) ou para
salvar seu grande eu, dando-lhe um pouco de ar, e então se escreve
para não se perder na pobreza dos dias ou, como Virginia Woolf,
como Delacroix, para não se perder naquela prova que é a arte, que
é a exigência sem limite da arte.
O que há de singular nessa forma híbrida, aparentemente tão fácil,
tão complacente e, por vezes, tão irritante pela agradável
ruminação de si mesmo que mantém (como se houvesse o menor
interesse em pensar em si, em voltar-se para si mesmo), é que ela é
uma armadilha. Escrevemos para salvar os dias, mas confiamos sua
salvação à escrita, que altera o dia. Escrevemos para nos salvar da
esterilidade, mas nos tornamos Amiel que, voltando-se para as
catorze mil páginas em que sua vida se dissolveu, reconhece nelas o
que o arruinou "artística e cientificamente", por "uma preguiça
ocupada e um fantasma de atividade intelectual". Escrevemos para
nos lembrar de nós, mas, diz Julien Green: "Eu imaginava que
aquilo que anotava reanimaria, em mim, a lembrança do resto... mas
hoje nada mais resta senão algumas frases apressadas e
insuficientes, que me dão, de minha vida passada, apenas um
reflexo ilusório". Finalmente, portanto, não se viveu nem se
escreveu, duplo malogro a partir do qual o diário reencontra sua
tensão e sua gravidade.