A MOSNTRO-GRAFIA DA BARRAGEM
Uma barragem, tantas desterritorializações. Pedro, 6 alqueires, mora há oito anos no assentamento Novo Mundo, Miracema. Pasto para cinco ou seis cabeças de gado, planta arroz e feijão. Não pesca mais. José, faz farinha, planta milho, abacaxi e a incontornável mandioca. Mora há oito anos no assentamento Canto da Serra, Lajeado. Não sabe ler nem escrever. O que aproxima a realidade de pobreza dos reassentamentos criados a partir da construção da UHE-Lajeado é o fracasso da experiência coletiva aliado ao abandono do poder público. Com a política energética do estado voltada para as grandes barragens vieram os impactos que afetaram a vida do rio Tocantins, seus fluxos e seus ciclos, a navegação que praticamente se esgotou e que se praticava há cerca de quatrocentos anos. Com o aparecimento do reservatório da UHE-Lajeado, deram-se também os impactos nas margens do grande rio, o 20° maior do mundo. Em Palmas, a região das ARNOS tornou-se o núcleo baldio da cidade. Nos demais municípios do entorno, não é difícil identificar os problemas que marcam a vida das famílias reassentadas, definindo suas vidas, e mais além, a história de suas vidas em antes e depois da barragem. Impedidos de ser o que poderiam ser, tolidos de informação e assistência técnica na busca de sustentabilidade, se deixam ficar em suspenso, afastados do lugar cultural do nascimento e da mítica casa em que tudo se deu desde seus pais. Manoel morou 35 anos às margens do rio Tocantins, está há oito no Novo Mundo. Um tanto de todo esse mal vem indiciar o prenúncio e o presságio de algum mal maior. Daí se poder falar numa monstro-grafia da barragem. Pelo que se desviou de vida e se deformou de caminhos. Pelas aberrações que se pode cometer e financiar contra o homem e a natureza. Homens amontoados, rio subjugado.
Ney Ferraz Paiva
Imagem: Louise Bourgeois
Nenhum comentário:
Postar um comentário