REDESENHAR O RISCO
A arte está em risco – A arte está por um risco. Rosana Ricalde
arrisca-se aos revezamentos alternativos e radicais ao se associar aos “desenhadores
de palavras” (Mallarmé, Apollinaire, Ezra Pound, Mário Sá-Carneiro, e. e.
cummings) e menos, bem menos, aos “autores de imagens”, todos eles, sem
exceção. Riscalde não se contenta com o olhar distante dos que contemplam nos
museus e galerias; ela quer o olhar atônito dos que devoram, dos que transitam
sem destino a cidade e as ruas, a querer saber, a indagar-se como um Josef K,
sem dar a mínima para as descrições, paisagens, estações. Riscalde busca as
conexões do olhar – olhares & proliferações que o texto, antes, anuncia
nas suas reações, nos seus deslimites e atravessamentos. Suas palavras não
saltam de um espelho e sim de um lago. Ali estamos submersos, afogados. O
cotidiano que torna a ser, infinitamente, não nos devolve a nossa face. Somos agora
a caligrafia de um mito que se simula. Redesenhados. Riscados. Corpos e
linguagens de erros, distorções. Submersos aí, irreconhecíveis. Atraídos cada
vez mais pela dissimilitude dos jogos e brincadeiras de uma infância que a
todos escapa, mas que por vezes retorna, incrustada silenciosamente na carne. O
pintor Francis Bacon afirmou serem os açougues suas catedrais. Ricalde não é
menos dramática ao nos lançar de volta a nossas lembranças, que não deixam de
se constituir numa lógica de sensações animais, maquínicas, do nosso nomadismo
subjetivo e cultural.
Ney Ferraz Paiva
Nenhum comentário:
Postar um comentário