DAS COISAS QUE SE ATIRAM NOS POLÍTICOS
Esta é a fase do
espetáculo em que o público, não aguentando mais o ator, começa a arremessar
toda sorte de objetos e por vezes, até dejetos em cima dele. Significa que não
há reviravolta possível, nenhum ato de heroísmo nem de pura covardia, nada
resgatará o espetáculo de seu final pífio. O Político, talvez até mais do que o
artista, adora palcos, e também tribunas, palanques, plataformas. Por mais
desagradável que seja o cenário, por mais grotesco que seja o enredo, aí ele
encena o melhor dos mundos. Apenas a alguns centímetros do chão, ele se
acredita numa torre de marfim. Refugiado da carência, fraqueza, impotência
diante da vida. Sobem com ele aí toda burocracia e jurisdição. Juntos falam
melhor do progresso social e econômico que promovem. Dos grandes avanços da
Indústria e do Mercado. Das notáveis contribuições do Partido na grande cidade
que governam. Daí para o resto do país, sobre o palco, anuncia-se a melhor das
escolas, não porque indivíduos mais educados tornam-se mais produtivos, mas
porque o público “sonha” com essa escola. Ela vai bater à sua porta todas as
manhãs e todas as noites que o filho sair para estudar sem saber se ele voltará
vivo. Todos humilhados nesse pesadelo em que também é incerto toda sorte de
direitos: saúde, emprego, comida. Infelizmente o “respeitável” público não tem
como passar sem isso. Daí que todas essas coisas não deixam de ser
implacavelmente anunciadas, recapituladas, de punhos erguidos, como maravilhas
de um mundo iminente, com a condição, é verdade, de serem mais uma vez
repetidas amanhã, como forma de reativar os ânimos e dissuadir os pessimistas.
Vida e bem-estar social só se opõem do ponto de vista dos políticos. Para eles
se está sempre nas etapas antecedentes do desenvolvimento. O melhor dos mundos
nunca é efetivo. Eles sabem trapacear "limpo" - sabem que
imagens turvadas, embaralhadas estão sempre a favor do réu, falam do que
ninguém mais pode tornar preciso - terá sempre um Moro a fazer (este sim) o
serviço sujo. O estado e sua jurisdição volante e violenta! Se crianças
ainda morrem de fome no Norte e Nordeste, se o tráfico de drogas domina cidades
inteiras, se não há médico, remédio, salário, vergonha na cara – eles brandem
tudo isso, porque tudo está prestes a melhorar.... Enquanto nada acontece, eles
se distraem com o grande público. Riem da corrupção, da ineficiência, dos altos
impostos. Pelas mesmas razões estúpidas a que sempre recorrem, conclamam o
público a votar. Tudo a um passo de acontecer. A escola, a saúde, o emprego, a
comida. Só que por um descuido, uma falha na produção do espetáculo, ou talvez
animado pelas pesquisas ou pelas benesses delirantes do cargo que disputa, ou
ainda, por amor ao bom público, um deles desce do palco e, longe dos holofotes,
com passos que se revelam trôpegos, se põe a andar entre as pessoas; e ali, de
súbito, tudo começa a dar errado: a tentativa de proximidade não surte efeito,
os gestos resultam falsos, e todos começam a perceber os signos de um triste
desenlace. Que o enredo é falho, a fala é de um clown e a maquiagem
esconde a face de um ator ruim. O público se depara com um espetáculo que já
deu, se esgotou, saturou a todos. A esse ator só resta fugir, partir pra outra.
É a fase do espetáculo em que o público começa a arremessar toda sorte de
objetos... Ou ouvem-se tiros... Cortina!
Ney Ferraz Paiva