Amanhã
passaremos a datar 1990. Entramos na última
dezena
do milênio. Muda a minha noção de tempo?
Sim
e não. A última dezena do milênio soa imperativa
com
um longo rastro histórico que se arrasta em sinuosos
movimentos.
O
meu tempo pessoal é fugaz, desaparece quando tento aflorar-lhe
o
conteúdo.
Minkoswski
introduziu em psicopatologia a noção de espaço
vivido,
juntamente com a noção de tempo vivido.
As
distâncias entre objetos, por exemplo, não são experienciadas
de
maneira constante independentemente das situações
subjetivas.
Minkowski descreve o espaço claro caracterizado
pela
nitidez do contorno dos objetos, pela existência de
espaço
livre entre as coisas.
Noutro
tipo de espaço vivido, o espaço escuro,
não se
trata
de luz física, porém de sensação de se estar encobrido,
apertado,
oprimido por uma obscuridade misteriosa.
Apaga-se
a distância estre os objetos (distância vivida).
O
espaço vital estreita-se sem perspectivas.
Sinto-me
tentada a transpor estas noções de espaço claro
e espaço
escuro aos diversos momentos e lugares da
História.
Acredito que estamos vivendo um momento
que poderíamos
chamar de momento de espaço obscuro.
Giselda
Leirner, domingo, 31 de dezembro de 1989
Imagem: Ney Ferraz Paiva, colagem cobre
fotografia de Giselda Leirner em Toulouse
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